MEIAS-VERDADES: MENTIRAS-INTEIRAS

lobocordeiro

Já falei um pouco sobre isto aqui neste outro post.

Que mania é essa que temos de negar uma verdade com outra?

Os cristãos evangélicos adoram fazer isto. É um tal de “não, mas e se...” pra lá, “não, mas e quando...” pra cá; e “mas” aqui, “mas” ali, “mas” acolá...

Mas – digo eu – que coisa!

Veja bem: eu não estou condenando o livre pensamento ou inibindo a dúvida sincera, a incerteza de algo e a busca por uma verdade definitiva. Não!

Estou falando é de quando uma verdade dita é ignorada convenientemente por que há outro texto, noutro lugar, que diz “assim, assim e assado”. Então, a pessoa, inescrupulosamente, teima em crer naquilo (o que, em si, não seria problema algum), descrendo disso (o que, aí sim, é um problema e tanto).

A Bíblia não se contradiz. Nem mesmo consigo ver incoerência alguma entre os tempos do Velho Testamento (ou “Tempo da Lei”, como a gostam de chamar os teólogos) e o Novo Testamento (o famoso “Tempo da Graça”).

Embora alguns acreditem nisso, não consigo conceber a idéia de termos nas mãos um livro, notadamente inspirado por Deus, que diga algo e o negue depois.

Prefiro crer que Deus, em Seu supremo poder, usa tudo (parece óbvio, não?). Assim, um texto se soma a outro, um entendimento acrescenta clareza ao outro, e no fim podemos conhecer melhor.

Não se pode lançar mão de um texto, preterindo outros. Não convém crer aqui, e duvidar ali. Não é coerente concordar algures; e negar alhures.

Quem o faz é leviano.

O diabo, inclusive, usou deste artifício quando tentou a Jesus. De posse de “parte da verdade” tentou seduzi-Lo. “Não é assim que está escrito?”, dizia ele. Interessante que Jesus não o desmente. “Sim”, respondia, “mas também está escrito...”, acrescentava, porém.

A despeito de, sim, haver, para um determinado texto ou assunto, tantas circunstâncias, tantos fatos correlacionados, tantos detalhes históricos, etc, há também um Deus; soberano, onisciente, onipotente, cuja mão rege tudo e que não pode ser surpreendido em nada.

Se há um contexto histórico que eu ignoro, Deus é maior do que eu, e o conhecia muito melhor. Ele sabia de minha futura ignorância acerca dele (contexto histórico) também. E se nem por isto o explicou, é porque não precisava explicar.

Muitas coisas foram ditas e feitas por Jesus que não foram escritas, diz o evangelho, “... Estas, porém, foram registradas para que creiais que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que, crendo, tenhais vida em seu nome.” (João 20:31)

Creio muito mais nisto.

Uma fé simples não procura elementos adicionais para crer. “Porque me viste, creste?”, disse Jesus a Tomé, “Bem aventurados os que não viram e creram”, ensinou.

Aliás, a fé bíblica sequer pergunta qualquer coisa para crer após. Ora, se ela precisa de esclarecimento não é fé, é razão. E um justo não vive pela razão.

“A fé baseada na razão é um tipo de fé, mas não se trata do caráter da fé bíblica, pois segue infalivelmente a evidência e não possui uma natureza moral ou espiritual”

(A. W. Tozer)

Clicando aqui, você lê outro artigo do saudoso Dr. Tozer sobre o crente, e seu tipo peculiar de fé que agrada tanto a Deus.

Freqüentemente queremos acrescentar às Escrituras razões para a Igreja crer mais facilmente nelas. Ninguém precisa disto. Não precisamos nem mesmo de amplos conhecimentos do grego, do latim, do hebraico, do aramaico ou de qualquer ciência histórica ou bíblica crer em Deus. A verdade, nua e crua, é esta: não precisamos! Qualquer um pode crer plena e satisfatoriamente em Deus da forma como está e nos foi disponibilizado.

Não fosse assim, só os letrados e cultos é que poderiam entender (e assim obedecer melhor) as Escrituras. E sabemos que não é assim.

Antes, pelo contrário, muitas vezes (não todas) uma intelectualidade avançada faz a pessoa ser mais complicada na prática da Palavra. O reino de Deus, entretanto, é para os simples, os humildes, os pobres, os últimos, os indigentes... Pessoas como essas. Por mais inteligentes que sejam.

Lembremo-nos que os inimigos de Jesus eram exatamente os mais sábios (segundo o homem) daqueles dias.

Mas ser sábio não é o problema em si.

O problema é usar tal sabedoria para negar o que está claro e simples.

Afinal, não precisamos saber tudo.

Só precisamos saber certo.

“DE QUE IGREJA VOCÊ É?”


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É uma das perguntas mais comuns que fazemos e ouvimos.

Mas, “quantas igrejas existem?”, eu pergunto.

“Miríades e miríades”, respondeu alguém certa vez.

A resposta arrancou (e ainda arranca) boas risadas de nós, que estávamos perto naquele dia.

Mas é triste!

E é triste exatamente porque o rapaz estava absolutamente certo.

Errados estamos nós.

Sabemos o conceito correto de Igreja, segundo Deus, mas fazemos exatamente o contrário (porque nos convém). E ai daquele que ousar mexer ou mudar alguma coisa!

A justificativa para não movermos uma palha sequer é quase sempre a mesma: “Deus está usando a Igreja assim!”. Sim, mas tem mesmo que usar! É o que Ele tem! É a única coisa que damos a Ele! Ninguém faz nada pra mudar!

Aí, em pró de Seus interesses, Deus usa o que dá para usar no momento. Tal como usou a lei em certo tempo, inclusive... Ou a mula de Balaão!

Aguardando, enquanto isso, pela plenitude de Sua vontade.

E a plenitude é que há um só Corpo, salvo mediante um só batismo, ao redor de uma só fé e servindo a um só Senhor.

Muito diferente, portanto, desse monte de pedaços independentes espalhados por aí: um povo sem consentimento mútuo, sem afeição uns pelos outros, bairrista e, o que é pior, defendendo interesses próprios, que chamam “fé”, não apenas distintos entre si, mas, muitas vezes, completamente conflitantes.

Mera palha, entretanto.

Em vindo o Fogo Consumidor, pouco ou nada ficará!

Mas, àquela altura, os santos filhos de Deus já estarão à salvo em algum lugar de Sua glória eterna!

Onde eu espero estar também.

“Ah, Senhor!”

EU NÃO ESTOU APAIXONADO POR JESUS



Não tem jeito. Eu tentei me conter, mas não tem jeito. Vão me chamar de louco, de radical, de julgador, de isto, de aquilo... Mas não posso me calar ao que sinto. E estou pronto para as pedras, se vierem.


“A mediocridade é a arte de não ter inimigos”, disse o humorista peruano Sofocleto. A isto eu acrescentaria ainda que uma mediocridade que se preze não tem consciência de si própria, posto que é medíocre. Assim, seria medíocre de minha parte não mexer neste vespeiro; e medíocre será quem nem ao menos considerá-lo.


É comum a Igreja tomar emprestado alguns valores dos tesouros escusos que o mundo possui, para utilizá-los no serviço sagrado de servir a Deus.


Creio que isto ocorre, em parte, por inspiração de um testemunho pessoal feito por Paulo em sua primeira carta aos coríntios, capítulo 9, versículos 20 a 23, quando ele dizia ter se feito passar por tudo (judeu, sem lei, fraco...) para com todos com o fim de salvar alguns.


Mas temo ainda mais que, no (des)esforço de ser “tudo para com todos”, a Igreja acabe por aceitar ser também tola para com os tolos, tornando-se estúpida; e impura para com os impuros, tornando-se mundana.


É assim que hoje vemos elementos místicos de tamanha estranheza sendo misturados à fé cristã genuína, produzindo mais uma espécie de sincretismo evangélico do que qualquer suposta manifestação espontânea de Deus, no sentido de alcançar alguém ou alguns, como a gostam de legitimar.


Um desses elementos é a paixão.


Quero crer que, em algum momento, em algum lugar, por alguma razão muito justificável e pura, alguém, completamente enlevado pela presença de Deus e constrangido a dizer-Lhe algo que fosse original, ousou pronunciar-Lhe as palavras “Estou apaixonado por Ti!”. Esse gesto, sem dúvida, deve ter alegrado muito o coração do Pai, porque pretendia sintetizar o “insintetizável”, traduzir o intraduzível e dizer o que era – agora se sabe – simplesmente indizível.


Aliás, este termo aí, “simplesmente”, nos remete àquela que é o grande divisor de águas entre o que pode ou não ser aprovado diante dos olhos de Deus: a simplicidade. Segui-la é garantia de sucesso; abster-se dela, de fracasso.


Lembremo-nos, por exemplo, de que a diferença entre o sacrifício de Abel e de Caim é que o primeiro foi, ipsis litteris, do jeitinho que Deus pediu; enquanto que o segundo foi inovador, diferente. Nada, porém, do que “rezava a cartilha de Deus”. E o resultado, todos sabemos qual foi.


Mas, das duas, uma: ou havia alguém perto quando aquele sincero adorador declarou seu amor apaixonado a Deus, e esse alguém achou bonito, inovador, diferente, “mó legal” e resolveu espalhar; ou o próprio autor da façanha resolveu repetir a dose...


E pegou!


Infelizmente.


Porque agora é um tal de estar de apaixonado por Deus pra cá, estar apaixonado por Deus pra lá, estar desesperado de amor, enlouquecido de amor, bêbado de amor, enamorado, ensandecido, alucinado...


Às vezes, sinto como se estivesse assistindo ao diálogo de um casal, durante uma tórrida cena de amor, num filme romântico qualquer.


Nossas músicas... Nem o Wando faria melhor!


E então somos uma geração de apaixonados... Ora, mas vejam só!


Segundo alguns dos muitos dicionários que procurei, a paixão é uma espécie de sentimento excessivo, amor ardente, afeto violento, entusiasmo, cólera, grande mágoa, vício dominador, alucinação, sofrimento intenso e prolongado, parcialidade.


Vale também uma consulta pelo Wikipédia para ver a definição de paixão por lá.


E há outras definições, provavelmente menos oficiais, mas nem por isto, desinteressantes, como a do Melhor da Net que diz que a paixão é o amor que se desequilibra. Ou a do Diclucki que diz que ela é o sentimento que impede de se raciocinar com a lógica. Ou ainda a do Blog da Adriana, que define paixão como sendo algo intenso, mágico, que parece único, e que conclui dizendo: “O grande problema é que sem os componentes de intimidade e de compromisso do amor, a paixão pode desaparecer de repente, tão rápido quanto apareceu.



Aliás, este último detalhe é de grande relevância para o que me proponho dizer aqui.


Há uma grande diferença entre amar e estar apaixonado, e, nisto, todos parecemos concordar. Mas um desavisado alienígena, que nos visitasse e visse de perto muitas das manifestações de paixão que são feitas ao Senhor, concluiria facilmente que a paixão deve ser, sem dúvida, um estágio avançado de amor; quando o contrário é que é verdadeiro.


A paixão é passageira e, pior, curtíssima. O amor jamais acaba (I Coríntios 13:5b). A paixão é algo superficial, comum e relacionado à pele. O amor é profundo, sobrenatural e está ligado ao caráter, ao espírito.


A professora e pesquisadora da Universidade Cornell de Nova York, a americana Cindy Hazan, acredita que a paixão nos seres humanos dure – veja só! – de 18 a 30 meses, “tempo de vida” suficiente apenas “... para que o casal se conheça, copule e produza uma criança” (leia aqui).


Desculpem-me usar neste texto essa linguagem tão formal, científica e talvez carnal demais para alguns, mas o que quero exatamente é ressaltar isto: preocupa-me esta inserção de valores feita à revelia no seio da Igreja. Nem sequer sabemos o que significam certos termos que utilizamos.


Talvez o conceito das Escrituras nos valha, não é?!


Lá, vamos encontrar cinco referências à palavra paixão. Em apenas uma delas, o termo hebraico usado, “yahab”, foi traduzido como “apaixonadamente”, indicando intensidade (Oséias 4:18), mesmo assim relacionada a algo ilícito, a desonra. Em outras duas (Provérbios 7:11; 9:13), a palavra é “hamah” (apaixonado), cuja raiz é, entre outras, murmurar, rosnar, rugir, enfurecer, tumultuar e perturbar. Quanto a Ezequiel 23:11, o termo que foi traduzido por paixão é “àgabah” e significa lascívia mesmo, exatamente como foi traduzido em Colossenses 3:5, sem rodeios: “... paixão lasciva...”


Como vêem, a paixão não parece gozar de muito prestígio bíblico.


Mas não é apenas uma questão de semântica, como se substituindo um palavra por outra, a coisa pudesse se resolver. Não, infelizmente.


Há todo um clima, um ambiente místico criado ao redor deste “mover”: músicas longas e de frases curtas que, repetidas à tão grande exaustão, lembram mais alguns mantras hindus; danças (ou meros gestos?) semelhantes a um estado de transe hipnótico e afeições estático-abobalhadas um tanto quanto esquisitas demais, como se a pessoa estivesse sob o efeito de alguma droga anfetamínica.


No fim, tal experiência pareceu mais fruto de uma abdução que de um “encontro com Deus”.


Aliás, não lhes soa estranho que “encontros com Deus” não eram tão freqüentes assim na vida dos santos do passado? E, se haviam, os sintomas eram muito outros!


Quando Deus falou do meio da sarça que ardia, Moisés “... escondeu o rosto, porque temeu olhar para Deus” (Êxodo 3:6). Mais tarde, curiosamente depois de outras aparições apoteóticas, Deus responde a um pedido de Moisés para ver a Sua glória dizendo: “Não me poderás ver a face, porquanto homem nenhum verá minha face e viverá” (Êxodo 33:20). Moisés só viu o que pôde ver, e sequer ao menos sabia que seu rosto resplandecia depois disso (Êxodo 34:29).


Isaías “viu” a Deus e, porque creu, temeu pela própria vida. Zacarias “viu” a Deus e, porque não creu, ficou três meses mudo. Mas nem nestes casos nem noutros, vemos qualquer coisa parecida com o que temos visto em nossos dias.


Será que somos uma geração mais privilegiada que as gerações bíblicas?


Vejam também os grandes pais de nossa fé: Agostinho, Lutero, Wesley, Finney, Moody... Homens introspectivos, castos, reverentes, morigerados. Por que não lhes copiamos?


Ah, porque somos os “adoradores extravagantes”, não é?! Será que não vemos? “Extravagante” significa “esbanjador; perdulário”. O que isto tem a ver com Cristo, meu Deus?


Há um excelente artigo escrito pelo Pr. Vanderlei Frari, de Londrina/PR, entitulado “Extravagante ou Extravasante?”, e que eu recomendo, em que ele corrige o termo (talvez quiséssemos dizer “extravasante”, cujo significado vai bem mais à calhar), e faz uma proposição interessante: porque não nos levantamos como uma geração de “ofertantes extravasantes”?


Eu aproveito e sugiro também uma geração de “santos extravasantes”, ou de “servos extravasantes”, ou de “perdoadores extravasantes”, ou de “obedientes extravasantes”, enfim.


Mas o fato é que eu considero suspeita essa manifestação pós-modernista de culto, porque todo encontro do homem “com Deus” resultou sempre numa mudança radical de seu caráter (e algumas vezes até do nome), fazendo-o olhar-se dentro e conhecer-se tão potencialmente mau que não lhe restava outra coisa senão tremer e temer.


E o que sugiro aos meus amados irmãos que sinceramente querem expressar-se a Deus é mesmo isto: uma reflexão; igualmente sincera.


E, ao mesmo tempo, que fiquem tranqüilos com o que eu digo aqui, porque é apenas a opinião de alguém que também será julgado diante de Deus; motivo pelo qual eu temo muito não ser achado aprovado por Ele...


Inclusive, naquilo que julgo estar fazendo em Seu nome (Mateus 7:22).

PALÍNDROMO







CARA OU COROA?


Alegria
e temor ficam em lados opostos no tempo: quem quiser a vida em constante alegria, na hora da morte, há de temer; quem quiser a vida em constante temor, na hora da morte, há de se alegrar.

(Baseado num pensamento de Tomáz de Kempis)

O EVANGELHO DA CAIXINHA DE PRECIOSAS PROMESSAS


Antes de ler, por favor, veja o vídeo abaixo:

É um belíssimo comercial veiculado na imprensa em 1988, de criação da empresa brasileira de publicidade W/Brasil, de Washington Ollivetto, para o Jornal Folha de São Paulo.

Gosto dele particularmente por causa da frase: “É possível contar um monte de mentiras dizendo só a verdade”.

É mesmo.

O Senhor que o diga.

Deus nos deixou um legado maravilhoso em Suas Sagradas Escrituras. Aquele que nelas crê, sem dúvida, é bem-aventurado.

Mas crer nas Escrituras não significa escolher o que crer nelas.

Não se lê a Bíblia como se faz compras num supermercado. No supermercado, você caminha livre e descontraidamente (ou não) pelos corredores, olhando as prateleiras e escolhendo o que levar, segundo suas conveniências pessoais e com base em seus valores, descartando as demais coisas, ou porque não lhe interessaram, ou porque não estão à altura de seu orçamento para aquele momento.

Além disto, por maior que sejam suas compras, você não leva o supermercado inteiro pra casa.

Com a Bíblia, entretanto, não é assim.

Infelizmente, vejo que muitos a usam como fonte de inspiração digna de palestras motivacionais, ou como uma espécie de tratamento alternativo para certas patologias psicológicas, ou ainda como os livros de auto-ajuda que enchem as prateleiras das livrarias: um emaranhado de frases de efeito com cunho eminentemente emocional.

Este texto, assim como o blog em si, não é dirigido ao mundo. Estou falando para a Igreja.

Basta assistirmos a algumas reuniões dominicais que são feitas pelos infindáveis púlpitos congregacionais que existem por aí e chegaremos a uma (terrível) constatação: as mensagens parecem ter saído de uma daquelas infames caixinhas de preciosas promessas disponíveis nas lojas de material evangélico.

Outro dia, tolo que sou, fiz um teste: abri uma caixinha daquelas e espalhei todos os cartõezinhos pela mesa, procurando um mandamento que fosse. Não encontrei nenhum. Todos os versículos falavam sobre vitória, sucesso, alegria, felicidade, riqueza, etc.

Muitos bônus; nenhum ônus.

Um alento e tanto para uma alma egoísta e desamparada, sem dúvida. Mas tal pessoa não deve estar à procura de Deus para satisfazer-se com aquilo. E se não está mesmo à procura d’Ele, melhor seria se procurasse outro livro.

Sim, porque a Bíblia é um livro tão poderoso para aqueles que desejam conhecer a Deus quanto é um fracasso para os que buscam apenas uma solução fácil para seus conflitos existenciais de alma.

E a razão é que a Bíblia não é um livro escrito para a satisfação do homem; mas de Deus.

As boas novas de Jesus não eram emocionalmente tão boas assim. Negar a si mesmo, tomar a cruz, perder a vida, renunciar a tudo, odiar a si mesmo, amar o inimigo, vender tudo e dar aos pobres, perdoar sempre... São apenas alguns de seus critérios e ensinos, nem um pouco motivacionais.

Nas Escrituras, feliz é aquele que aqui neste mundo não tem aparentemente motivo algum para se alegrar: “Bem-aventurados... os pobres... os que agora tendes fome... os que agora choram... quando os homens vos odiarem... vos expulsarem... vos injuriarem e rejeitarem...” (Lucas 6:20-23)

“Ora, mas Deus não é nenhum déspota!”

Sim! Mas também não é nenhum supermercado!

Deus quer nos dar a vida, a vitória, o sucesso, a felicidade, a alegria e a riqueza do Seu jeito, do Seu modo, com o Seu justo e devido preço.

Não podemos pretender ter algumas coisas em detrimento das demais; preterir por preferir.

Isto seria como criar um evangelho paralelo, diferente do que Jesus pregou. Um evangelho que Juan Carlos Ortiz chamou de “O Evangelho Segundo os Santos Evangélicos” em seu livro “O Discípulo”:

“O evangelho que encontramos na Bíblia é o evangelho do Reino de Deus. Ele apresenta Jesus como o Rei, como o Senhor, como a autoridade máxima. Jesus se encontra no centro do evangelho. O evangelho do Reino é cristocêntrico.

“Nos séculos mais recentes, porém, temos ouvido falar de um outro evangelho – um evangelho cujo centro é o homem, um evangelho humano. É o evangelho da oferta tentadora; o evangelho da venda fácil; o evangelho do negócio vantajoso que ninguém pode recusar. (...)

“Nosso evangelho é como a lâmpada de Aladim; pensamos que podemos esfregá-lo e obter tudo que quisermos. Não é de admirar que Karl Marx tenha dito que a religião é o ‘ópio das massas’. Talvez ele tivesse razão; ele não era nenhum tolo. Ele sabia que o evangelho, para muitas pessoas, era apenas uma fuga. (...)

“Este evangelho moderno é o que eu chamo de Quinto Evangelho. Já contamos com o Evangelho segundo São Mateus, o Evangelho Segundo São Marcos, o Evangelho Segundo São Lucas, o Evangelho Segundo São João e também o Evangelho Segundo os Santos Evangélicos. Este último é um apanhado geral dos outros quatro; são textos que recolhemos aqui e ali neles. Tomamos passagens de que mais gostamos as que oferecem ou prometem alguma coisa – como João 3:16 ou 5:24 e assim por diante – e construímos nossa teologia sistemática em torno delas, e esquecemos todos os outros versos que apresentam as ordenanças de Jesus Cristo. (...)

“Eu poderia dizer que o Quinto Evangelho é composto de todos os versos que nós sublinhamos. Se alguém desejar ler o evangelho do Reino, basta pegar a Bíblia, e ler todos os versos que não grifamos, pois eles compõem a verdade que omitimos (...)”

Como foi dito no início, é possível contar um monte de mentiras dizendo só a verdade.

Aí está!

“O Evangelho da Caixinha de Preciosas Promessas” é o nome que eu dou a isto aqui.

Aos seus admiradores, sugiro que levassem a caixinha mesmo às reuniões. É menor, mais leve e mais barata do que uma Bíblia de verdade.

Mas outra boa alternativa é ler a sessão de horóscopo dos jornais.

Não é muito diferente, acredite!

REINÍCIO DO REINÍCIO


recomeçar

Encontrei um pedaço de papel num hinário antigo que tenho aqui em casa e gostaria de compartilhar com vocês o texto que está escrito nele. Não conheço a autoria (se alguém conhecer, me diga que eu incluo devidamente os créditos).

Ei-lo:

“Se você começou uma boa obra e parou, comece outra vez. Não fique parado, apenas lamentando o fato e se recriminando por isso.

Se você começou a ler a Bíblia com regularidade e parou, comece outra vez. Se você começou a orar mais intensamente e parou, comece outra vez. Se você começou a evangelizar parentes e amigos e parou, comece outra vez. Se você começou a disciplinar seu gênio explosivo e parou, comece outra vez. Se você começou a amar as pessoas difíceis e parou, comece outra vez. Se você começou a combater a ansiedade e parou, comece outra vez. Se você começou a se abster das relações sexuais ilícitas e parou, comece outra vez. Se você começou a se privar das bebidas alcoólicas e parou, comece outra vez. Se você começou a se livrar das drogas e parou, comece outra vez.

Não é bom parar uma boa ação gerada e encorajada pelo próprio Deus, logo no início, ou no meio, ou na reta final. Mas isso acontece com você e com todo mundo. Importa voltar e praticar as obras que se praticava no princípio, como Jesus explicou ao anjo da Igreja em Éfeso (Ap.2:5).

Com muita disposição, os judeus que voltaram do exílio começaram a reconstruir o templo de Jerusalém (Ed.3:8). Pouco tempo depois a obra cessou por causa da oposição dos inimigos e por causa da escassez de ânimo (Ed.4:24). Graças, porém, ao encorajamento dado por Ageu e Zacarias, os exilados voltaram ao trabalho (Ed. 5:2).

Não importa o número de reinícios. Mesmo que cheguem a setenta vezes sete (Mt. 18:21,22). O importante é que você reinicie o reinício sempre que necessário!

Deus o abençoe!”


ELIÚ


Para os cristãos, a Bíblia é também, entre tantas outras coisas, um livro repleto de histórias de heróis. Homens e mulheres que se tornaram ícones de tamanha envergadura que foram eternizados simplesmente no livro mais popular de todos os tempos.

Sim, há controvérsias, eu sei. E em tudo há, na verdade. Mas, obviamente aqui, não me proponho a falar de nenhuma delas.

De todos esses heróis, indubitavelmente, o mais destacado é Jesus, como não podia deixar mesmo de ser. Mas há outros que também se destacaram, num nível, obviamente, “inferior” (para melhor compreensão), mas nem por isto menos importante. Podíamos citar os mais conhecidos: Noé, Abraão, Moisés, Davi, Salomão, Paulo entre outros; muitos outros.

Mas, na minha opinião, um deles talvez seja bastante... desconhecido, digamos, da grandissíssima maioria. Trata-se de Eliú.

Para quem não se lembra, Eliú fez parte da história de Jó, mas, inexplicavelmente, a Bíblia não fala dele de início. Segundo conta o livro, os três amigos de Jó que foram visitá-lo para ajudar na compreensão dos motivos de seu sofrimento tão rápido e tão doloroso, eram Elifaz, o temanita, Bildade, o suíta, e Zofar, o naamatita.

O primeiro leitor da história de Jó desconhecerá completamente a existência de Eliú até o capítulo 32.

É quando o texto o introduz ao enredo, vindo sei lá de onde, já que eram apenas três até ali, dizendo:

“Então, se acendeu a ira de Eliú, filho de Baraquel, o buzita, da família de Rão; acendeu-se a sua ira contra Jó, porque este pretendia ser mais justo do que Deus. Também a sua ira se acendeu contra os três amigos, porque, mesmo não achando eles o que responder, condenavam a Jó. Eliú, porém, esperara para falar a Jó, pois eram de mais idade do que ele.”
(Jó 32:2-4)

A partir daí, o que vemos é um jovem (imagino) destemido e cheio de sabedoria, movido pelo amor e reverência que tinha ao Senhor e desafiado em sua honra, dar – como se diria na gíria popular – “uma lavada” em Jó e em seus (mui) amigos.

Daí em diante, são cinco capítulos de intensa e gloriosa defesa da causa de Deus, mediante perguntas intrigantes, considerações pertinentes e muito louvor, fazendo Jó simplesmente corar, e se calar. Mais ainda, dando início ao que seria, um pouco mais a frente, a experiência definitiva da vida de Jó: o encontro face a face com Deus.

A Bíblia diz que, acabando Eliú de falar, Deus passa a falar com Jó do meio de um redemoinho (Jó 38:1), e segue falando, até culminar na célebre declaração que Jó fez, cantada em verso e prosa em todos os cantos em que se professe a fé cristã: “Eu te conhecia só de ouvir, mas agora os meus olhos te vêem.” (Jó 42:5)

Não por acaso, Eliú é, para mim, um modelo de fé a ser seguido, especialmente em nossos dias atuais: respeitoso, reverente, mas destemido.

Manteve-se calado o mais que pôde, sabedor que era de sua juventude em relação aos demais. Mas, diante das tantas infâmias e descalabros que ouvia, por fim, ergueu-se – ainda reverente apesar – constrangido em seu espírito, para, como ele mesmo disse, mostrar que tinha argumentos a favor de Deus (Jó 36:2) e para atribuir-Lhe justiça (Jó 36:3).

Ora, mas Deus precisa disto?

O acadêmico dirá que não. Que Deus não precisa de nada enfim.

Mas a alma irrequieta neste mundo certamente considerará Eliú um herói, afinal, ele representa (e resume em si) aqueles que não suportam ver qualquer mínima afronta dirigida a Deus (ainda que metafisicamente se saiba que Deus não pode sofrer dano algum).

Em dias de uma fé tão impessoal, frígida e humanista, Eliú seria uma espécie de ermitão. E sério candidato a mártir.

No meio cristão contemporâneo, faz-se mister que homens e mulheres – jovens ou não – se levantem contra as muitas bandeiras da incoerência que vêem sendo hasteadas em nome de um cristianismo essencialmente mundano, daqueles que fariam qualquer Constantino dos mais militantes se esconder de vergonha.

Se Deus precisa de algo é de defensores de Sua verdade pura e simples, e não de mentes criativas (ainda que aquelas mais avançadas) que encontrem um caminho intermediário entre a luz e as trevas, ou estabeleçam uma porta de largura mediana por onde passem (ou se enganem passar) muito mais gente do que o Senhor mesmo previu.

Àqueles em quem minhas palavras encontram abrigo, o meu apelo:

Não se curvem aos mandos e desmandos dos intelectuais que sugerem a relativização dos princípios cristãos e do conhecimento de Deus! Defendam a causa de Deus! Argumentem! Contra-argumentem! Atribuam-Lhe justiça! Posicionem-se contra o sistema do mundo que tenta mudar os valores altos dos ensinos de Deus! Não temam!

Talvez depois disto, lá do meio da multidão, possamos ouvir alguém, ainda que uma voz solitária apenas, dizer ou cantar:

“Bem sei que tudo podes,
e nenhum dos teus planos pode ser frustrado.
Quem é aquele, como disseste,
que sem conhecimento encobre o conselho?
Na verdade, falei do que não entendia;
coisas maravilhosas demais para mim,
coisas que eu não conhecia.
Escuta-me, pois, havias dito, e eu falarei;
eu te perguntarei, e tu me ensinarás.
Eu te conhecia só de ouvir,
mas agora os meus olhos te vêem.
Por isso, me abomino
e me arrependo no pó e na cinza”
(Jó 42:2-6)