RECEITA DE ANO NOVO*


*Por Carlos Drummond de Andrade



Para você ganhar belíssimo Ano Novo
cor de arco-íris,
ou da cor da sua paz,
Ano Novo sem comparação
como todo o tempo já vivido
(mal vivido ou talvez sem sentido)
para você ganhar um ano
não apenas pintado de novo,
remendado às carreiras,
mas novo nas sementinhas
do vir-a-ser,
novo até no coração das coisas menos percebidas
(a começar pelo seu interior)
novo espontâneo,
que de tão perfeito nem se nota,
mas com ele se come,
se passeia,
se ama,
se compreende,
se trabalha,
você não precisa beber champanha
ou qualquer outra birita,
não precisa expedir nem receber mensagens
(planta recebe mensagens?
passa telegramas?).
Não precisa fazer lista de boas intenções
para arquivá-las na gaveta.
Não precisa chorar de arrependido
pelas besteiras consumadas
nem parvamente acreditar
que por decreto da esperança
a partir de janeiro as coisas mudem
e seja tudo claridade,
recompensa,
justiça entre os homens e as nações,
liberdade com cheiro e gosto de pão matinal,
direitos respeitados,
começando pelo direito augusto de viver.
Para ganhar um ano-novo
que mereça este nome,
você, meu caro, tem de merecê-lo,
tem de fazê-lo de novo,
eu sei que não é fácil,
mas tente,
experimente,
consciente.
É dentro de você
que o Ano Novo
cochila
e espera
desde sempre.

Texto extraído do "Jornal do Brasil", Dezembro/1997,
mas aqui extraído daqui.

RESOLUÇÕES PARA 2009




Fim de ano é tempo de resoluções, planejamentos, alvos e sonhos para o ano que se inicia.

Eu já fiz os meus:



Decidi que esse ano não lerei muito a Bíblia.

Decidi que não jejuarei muito também.

Decidi que orar só se tiver muito tempo livre, e já estiver cansado dos lazeres.

Não me preocuparei mais com o que ver na TV, na Internet, nos jornais, revistas ou nos outdoors espalhados pela cidade, afinal eles estão lá para serem vistos mesmos.

Decidi não servir a mais ninguém...

Não ser generoso...

E não ser amável com minha mulher ou com minha filha. Que dirá com os outros!

Ah, e que minha casa pode até ser uma referência, sim... Mas do que não fazer!

Decidi também, resolutamente, que não sairei mais do aluguel esse ano.

E que não mudarei de carro.

E que não mudarei de emprego.

E que não mudarei nada.

Isto!

Decidi ser o mesmo para sempre.

E daí para frente não precisarei mais decidir nada...

Planejar nada...

Desejar nada...

Sonhar nada...


Pronto!

Agora é só esperar que mais um ano passe, e que, oxalá!, eu não consiga realizar uma só coisa do que tinha planejado para ele.

Como acontece, até com freqüência.

"ACASO, SOU EU, MESTRE?"



A traição é algo muito difícil de aceitar, e o motivo é que ela fere os princípios da lealdade, da sinceridade e, sobretudo, do amor, rompendo o elo mais importante numa relação: a fidelidade.

Mas trair alguém é também trair a si mesmo, já que depõe contra o próprio traidor, por não ter tido o caráter e a hombridade de manter incólume o vínculo de compromisso que prometera no início.

A traição, tal qual a maioria absoluta dos desvios de que a alma humana é capaz, tem várias formas e diversas maneiras de se revelar.

Seu impacto e repercussão, bem como a reação a ela e o tratamento que lhe é dado dependem diretamente, e muitas vezes, do critério de valores que recebe, tanto de um, o traidor, quanto de outro, o traído. Por essa razão é que se trai mais ou menos, a depender, ou se sente mais ou menos traído.

Independentes mesmo só sua definição e sua gravidade.

Quando Jesus voltou do deserto, onde passou 40 dias jejuando e para onde havia sido levado pelo Espírito para, entre outras coisas, ser tentado, trouxe conSigo uma “lista oficial” daqueles que haveriam de ser Seus discípulos mais próximos.

Nenhum daqueles nomes era de família nobre, nenhum daqueles homens era de linhagem real e nenhuma grande autoridade. Ao contrário, a relação continha gente simples, anônima, desvalida e de nenhuma notoriedade.

Mas um nome ali merecia especial atenção. Menos até pelo que ele era em si; mas muito, sem dúvida, pelo que viria a ser: Judas Iscariotes.

Acreditado que estou de que informações históricas pouco acrescentariam a este meu raciocínio aqui, passo adiante de quem era Judas na sociedade daquela época, para me deter apenas ao aspecto comportamental da relação entre ele e Jesus, especialmente no fim dela.

Desde o início, Jesus sabia quem era aquele que o haveria de trair (João 6:64).

E ninguém mais!

Nem o próprio Judas, arrisco dizer.

Durante aqueles três anos e meio, a relação entre eles fora absolutamente normal. Judas não fora preterido por Jesus em nada com relação aos demais discípulos. Jesus o acolhera, o abraçara, o corrigira, o repreendera na mesma proporção que os outros. Com ele brincara, e também com ele se alegrara quando o viu voltar, efusivo, da comissão dos setenta, por causa dos muitos milagres e sinais que se manifestaram por mãos deles todos. E Jesus lavara, inclusive, seus pés também.

Dessa forma, ele próprio, Judas, não tinha como saber.

Jesus não dera uma só dica. Nenhum olhar fora evitado. Nenhum aperto de mão esquecido. Nenhum abraço negado. Nenhum desdém. Nada.

E aquele era o homem que O haveria de entregar.

Mas Jesus o amou.

O Salmo 55 já fazia, centenas de anos antes, uma leitura absolutamente dramática da relação entre eles. Diz lá, profeticamente:


“Pois não era um inimigo que me afrontava; então eu o teria suportado (…)
Mas eras tu, homem meu igual, meu guia e meu íntimo amigo”
(Salmo 55:12-13)



Chega a doer no estômago uma constatação dessas.

Jesus assim considerava Judas: um homem seu igual, seu guia e seu íntimo amigo. Foi realmente assim que Jesus o tratou por todo aquele tempo, e foi nesta condição que foi traído por ele.

Uma evidência desse tratamento equânime e ilibado aconteceu na noite em que, juntos, comeram a ceia pela última vez.

Diferentemente doutras ocasiões, aquela solenidade já vinha trazendo consigo qualquer coisa de muito soturno. Mas nada que se comparasse ao momento em que Jesus revelou aos discípulos, para surpresa geral de todos, que um entre eles haveria de traí-Lo.

Estupefatos, todos passaram a perguntar-se, quase em uníssono, quem seria. Ninguém sabia, afinal, quem haveria de ser (João 13:22).

Imagino João, o discípulo amado, aquele que reclinava a cabeça sobre o peito de Jesus, perplexo e confuso, atemorizado consigo mesmo, diante da mínima possibilidade de ser ele o traidor do Seu amado mestre.

Nem ele, tão íntimo, sabia. E o tratamento era tão igual a todos, que até podia ser ele mesmo:

“Sou eu, Senhor?”

Imagino o sangüíneo Pedro, quase certo de que seria ele, tão volátil e de extremos que era:

“E eu, Senhor?”

Imagino Tomé, com tantas dificuldades para crer em algumas coisas:

“Puxa, será que vai ser logo eu, Senhor?”

E assim todos os outros... os dois Tiagos, André, Filipe e Mateus ... um a um... Judas Tadeu, Natanael, Simão (o Zelote) e Bartolomeu... até que...:


“Então, Judas, que o traía, perguntou:
Acaso, sou eu, Mestre?
Respondeu-lhe Jesus: Tu o disseste.”
(Mateus 26:25)


Os evangelhos divergem um pouco sobre como ocorrera (e se ocorrera) essa revelação de que Judas era o traidor. Talvez só se soube isto depois.

Mas é o tratamento dispensado por Jesus a Judas que me confronta.

Mesmo mais tarde, quando recebeu dele o irônico e malfazejo beijo, numa última manifestação de afeto entre eles que se tem conhecimento, Jesus novamente o chamaria: “Amigo...”

Fosse eu, e soubesse antecipadamente da covarde traição de alguém, sequer me aproximaria de um indivíduo tão asqueroso.

Mas, graças a Deus!, Jesus é infinitamente diferente de mim.

E amou o asqueroso.

Tal como deve amar a este ser ainda mais asqueroso aqui.

Com isto, concluo duas coisas:

A primeira é que o tratamento que Jesus deu a Seus amigos e traidores, deve me faz corar e me desafiar a vislumbrar meu próprio coração, e ver se tenho o direito que muitas vezes me dou de dar certa deferência a este ou aquele.

E a resposta é: não, eu não tenho direito algum, senão o de tentar, ao menos, copiar o meu Senhor e Mestre.

A segunda coisa é ainda mais desesperadora: a de que o tratamento que Jesus deu a Seus amigos e traidores, só me credencia, no máximo, a temer.

Afinal, a qual dos dois grupos pertenço?

Sou amigo ou traidor?

Sim, porque, pelo amor que recebo d’Ele apenas, não dá pra saber.

“Acaso, sou eu, Mestre?”


"AMIGOS, AMIGOS... NEGÓCIOS À PARTE"


Passados três anos e meio de profunda e intensa relação com Seus discípulos, ensinando-os quer por palavras quer por exemplos, curando e operando milagres e maravilhas, Jesus, presciente de Sua hora fatal, faz-lhes uma declaração, no mínimo, curiosa:

“Já não vos chamo servos (...), mas amigos...”
(João 15:15)

Não é curioso?

Porque Jesus contrapôs a palavra “servos” à palavra “amigos”? A frase mais óbvia talvez não fosse: “Já não vos chamo servos, mas livres”? Ou, quem sabe: “Já não vos chamo de apenas conhecidos meus, mas amigos”?

Que contraponto há em ser servo de Jesus e ser Seu amigo?

Além disso, o que Jesus tinha em mente quando “promoveu” (porque o sentido ali é mesmo o de promoção) os discípulos da condição de Seus servos para Seus amigos?

E, finalmente, que mal há em ser um servo?

São particularmente essas as questões que norteiam meu pensamento aqui.

Depois do pecado, o homem se tornou a criação mais carente de Deus que existia. Deus o havia criado santo e puro para Sua família eterna, mas agora o homem já não podia ser nem uma coisa nem outra.

Porém, mediante juramento por Si mesmo, uma vez que não havia outro maior por quem jurar, Deus prometeu que jamais desistiria de cumprir o Seu propósito na vida do homem. Para isto interveio milagrosamente, enviando Seu Filho, Jesus, em forma de homem, para Ele ser no final, por Seu santo viver, ao mesmo tempo, o Sacerdote e o Sacrifício, justos e derradeiros, não havendo necessidade de qualquer adendo ulterior à Sua obra redentora.

Em linhas gerais, o que se pode dizer é que Jesus foi a plenitude da vontade de Deus para os homens, e a plenitude da necessidade dos homens para Deus.

Ou seja, Jesus veio trazer tudo de que Deus e os homens necessitavam.

Como não poderia haver ninguém que conhecesse tão bem a vontade de Deus para os homens como Jesus, também não havia ninguém que pudesse realizar essa vontade, e atender assim tão bem às necessidades do homem para com Deus.

Jesus, então, perto de concluir Sua obra redentora junto aos discípulos, faz-lhes Seus amigos, muito mais do que Seus servos.

Isto nos remete a uma reflexão importante: um servo pode não ser tudo o que Jesus pretende de nós.

Sim, o servo obedece às ordens do senhor, mas, como está dito também lá no versículo, “não sabe o que ele faz”. O amigo, entretanto, conhece o que conhece o senhor, a sua intimidade.

Não concordamos que Jesus é o nosso modelo por excelência, inclusive de obreiro? Então devemos concordar também que só teremos êxito em nosso trabalho se formos, mais do que servos, amigos quando só então também conseguiremos formar indivíduos tais.

Parece grande coisa o servir (e o é), mas só trabalho cansa.

O portão que dava acesso aos campos de concentração nazista em Auschwitz, na Polônia, onde milhares de judeus foram mortos pelo governo alemão, e tirano, de Adolph Hitler, trazia (e traz, porque ainda está lá) os seguintes dizeres: “Arbeit Macht Frei” (“O trabalho liberta”).


Não!

O trabalho escraviza.

Os judeus perceberam isto logo que ultrapassaram aqueles portões.

Sem espiritualizar, em respeito até mesmo à triste memória desse trágico e lamentável acontecimento histórico da humanidade, para contextualizar aqui, eu diria que é a amizade que liberta.

O amigo desfruta dos prazeres. Partilha e compartilha os bens. Senta e relaxa junto. Conhece e participa dos problemas por um lado, mas ri e folga por outro.

Uma famosa frase atribuída a Aristóteles diz que a amizade “é como uma alma em dois corpos”.

Sei que você entendeu bem o que eu disse até aqui, mas deve estar também, involuntariamente até, pensando que eu falo apenas dessa amizade na relação entre Deus e nós.

De fato, isto deve ser algo absolutamente maravilhoso, mas é inefável na mesma medida, e por isto mesmo indescritível. Sabe-se que Moisés desfrutou de tal estado, mas eu creio que a maioria de nós – e eu muito mais entre todos – não sabe direito o que isto significa, ser amigo de Deus, embora o quisesse.

Mas eu não estou falando especificamente dessa amizade, mas, sim, de outra.

Estou falando de sermos e termos amigos entre nós mesmo: a Igreja.

Ora, isto é tudo o que posso dizer afinal, pois é tudo o que conheço – e olhe lá!

Há muito trabalho na Igreja, muitas coisas para se fazer. É preciso folgar. E precisamos dos amigos para tanto.

Precisamos, porém, nos lembrar que uma amizade não se exige; se conquista. Não se compra um amigo. Ninguém exerce um domínio voluntário sobre um sentimento amigo, e determina que ele aconteça com este ou com aquele. Ele simplesmente se manifesta espontâneo.

Jesus disse que Seus discípulos eram Seus amigos, mas entre eles estava o traidor. As palavras de Jesus não mudaram a natureza dos desejos malignos que estavam no coração de Judas.

Eu posso esforçar-me para ser amigo de alguém. Mas não será dizendo isto que serei. É preciso um convívio intenso, natural, agradável e sincero para que, de repente, um descubra que não pode viver sem o outro. E que, ainda que pudesse, jamais o quereria.

É possível encontrarmos muitos parceiros de obra na Igreja, que não necessariamente são nossos amigos (o que não significa que se tratam de inimigos nossos também). E certamente temos muitos irmãos! Mas a Bíblia diz que há amigos mais chegados que irmãos! Quanto mais chegados, mais íntimos, e os íntimos chegaram a um ponto onde a maioria ainda não chegou.

Um amigo é caro. Um amigo é raro.

Pouca gente sabe que Jesus tinha muitos discípulos, muito mais que os doze apenas (estes Ele escolheu para serem os apóstolos). Mas o interessante é que Jesus não chamou os Seus muitos discípulos de amigos, senão apenas os doze (ou os onze, como queiram). Isto porque, em aproximando mais aqueles homens para junto de Si, a fim de formá-los “os colunas da Igreja”, percebeu neles um relacionamento diferente, que lhes permitia finalmente serem considerados e chamados Seus amigos.

Talvez já tenhamos aprendido a sermos bons cristãos, e recebido algumas responsabilidades maiores na Igreja, tornando-nos, quem sabe, discipuladores, líderes e/ou pastores. Mas a demanda de trabalho e o nosso zelo ministerial podem nos privar do privilégio de sermos e termos amigos na Igreja. Gente pra quem você pode ser você, sem o crachá, sem a alcunha, sem o título... Sem a canga. Gente que compartilha do seu coração, e que não se assusta ou cobra quando ele se apresenta frágil e fraco, por que, no fim, é o coração dele também. Gente que se torna seu descanso na hora da fadiga natural que o labor impõe.

Alguns hão de dizer: “Mas Deus é esse descanso”, e acertarão. Mas Ele só o será se for também nosso amigo, muito mais que um gerente, ou um exigente ditador de ordens. Portanto, nos fará muito bem se não pensarmos de nós mesmos algo diferente disto, porquanto não somos e jamais seremos melhores que o Senhor.

A questão toda então não é se há mal ou não em sermos servos do Senhor. Mas se há algo melhor do que isto, do que estou completamente convencido.

Só trabalho, indubitavelmente, irá cansar os servos um dia, e eles só poderão querer mesmo a liberdade, tão sonhada qual o Quilombo dos Palmares.

Por sua vez, os amigos já possuem essa liberdade, e desfrutam dela, e, mais do que isto ainda, descobriram que exatamente a encontram quando estão juntos um do outro.

COM A CABEÇA À PRÊMIO



Hoje eu quero compartilhar com vocês algo que Deus trouxe ao coração de minha querida esposa, Rejane, e que ela repartiu conosco há algumas semanas atrás, no grupo caseiro:


“Como está escrito: Por amor de ti, somos entregues à morte o dia todo...”
(Romanos 8:36a)

Foi a nossa decisão por Jesus que deu origem a toda sorte de mazelas de alma e opressões que sofremos neste mundo.

Isto para mim, irmãos, foi muito esclarecedor.

De onde poderiam vir mesmo tantas inquietações?

Veja o mundo!

Dê uma olhada nas pessoas que vivem alienadas ao Reino de Deus e repare no estilo de suas vidas.

Alguns dirão: “São despreocupadas”.

Eu diria: “São indiferentes”.

Mas serem indiferentes não significa que estão desculpadas.

As pessoas mentem, enganam, fingem, e sentam-se depois, tranqüilas, para um cafezinho expresso com creme.

Os homens traem, ferem, matam e está tudo bem.

A lei da selva não os incomoda.

É assim que as coisas são.

Quem se importa de ter mentido afinal?

Ninguém.

A menos que nele haja algo tão santo e puro, ele jamais se importará.

Aliás, ele jamais se dá conta de qualquer mal que haja nisto.

Sim, porque seus valores são aqueles mesmos. Mentir, enganar, fingir, trair, ferir, matar é normal, e são apenas algumas das coisas com as quais ele está acostumado há muito.

Mas quanto aos santos, ah!, esses não podem mesmo estar à vontade aqui. Eles olham ao redor e estranham. Não entendem a linguagem, não gostam das roupas e não sabem como se comportar em muitas situações.

Os cristãos não são felizes.

Eles não são daqui.

Não fosse a excelência da vida que Cristo dá, não haveria dentro deles tanta insatisfação com a vida e o mundo aqui. É por causa do amor a Cristo que parecem seguir pela esteira de um abatedouro o tempo todo, e a qualquer momento uma lâmina surgirá de repente, para lhes querer cortar o pescoço.

Esse é o sentimento do filho de Deus.

Ele não está bem. Nem poderia estar.

E sabedor disso, Deus, solidário que é àquela dor, capacita o crente com graça e poder, a fim de que possa seguir seu rumo, na contramão do mundo, de maneira, ao menos, um pouco mais resignada.

Não é improvável, portanto, que você os encontre por aí com um sorriso sincero nos lábios.

Mas é impossível que estejam satisfeitos e felizes.

Eu não estou.

E espero, honestamente, que seja essa a razão.

SÓ EU SEI...




Só eu sei
As esquinas por que passei
Só eu sei
Só eu sei

Sabe lá
O que é não ter e ter que ter pra dar
Sabe lá
Sabe lá

E quem será
Nos arredores do amor
Que vai saber reparar
Que o dia nasceu?

Só eu sei
Os desertos que atravessei
Só eu sei
Só eu sei

Sabe lá
O que é morrer de sede em frente ao mar
Sabe lá
Sabe lá

E quem será
Na correnteza do amor
Que vai saber se guiar?

A nave em breve ao vento vaga de leve e trás
Toda a paz que um dia o desejo levou

Só eu sei
As esquinas por que passei
Só eu sei
Só eu sei

(Djavan, "Esquinas")
Álbum: Lilás
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