A PALAVRA CRIADORA*

* Por Santo Agostinho (354-430)

“De que modo, porém, criastes o céu e a terra e qual foi a máquina de que Vos servistes para esta obra tão imensa, se não precedestes como o artífice que forma um corpo de outro corpo, impondo-lhe, segundo a concepção da sua mente vigorosa, a imagem que vê em si mesma, com os olhos do espírito? Donde lhe viria esse poder, se Vós não lhe tivesses criado a imaginação?


O artífice impõe a forma à matéria – a qual já existia e já a continha – isto é, à terra ou à pedra, ou à madeira ou ao ouro ou a qualquer coisa material. Mas donde proviriam estes seres, se não os tivésseis criado? Fizestes ao artífice o corpo, fizestes-lhe a alma que impera aos membros. Criastes a matéria com que fabrica os objetos, a inspiração com que ele concebe a arte e vê internamente o plano que executa no exterior.

Concedestes ao artista os sentidos do corpo, com os quais, servindo-se deles como de intérpretes, transpõe da fantasia para a matéria a figura que deseja realizar. Com eles anuncia ao espírito o que faz, para que este lá dentro pergunte à Verdade – juiz da alma – se a obra foi bem realizada.

Todas estas criaturas Vos louvam como Criador de tudo. Mas, de que modo as fazeis? Como fizestes, meu Deus, o céu e a terra? Sem dúvida, não fizestes o céu e a terra, no céu e na terra, nem no ar ou nas águas porque também estes pertencem ao céu e à terra. Nem criastes o Universo no Universo, porque antes de o criardes não havia espaço onde pudesse existir. Nem tínheis à mão matéria alguma com que modelásseis o céu e a terra. Nesse caso, donde viria essa matéria que Vós não criáreis e com a qual pudesses fabricar alguma coisa? Que criatura existe que não exija a Vossa existência?

Portanto, é necessário concluir que falastes e os seres foram criados. Vós os criastes pela vossa palavra!”


(Agostinho, Santo – “Confissões”, 398 d.C.,
Ed. Universitária São Francisco, 2006)


EU



Sou paulista
Sou do B do ABC de lá
Sou mineiro
Sou do belo horizonte de cá

E dessas Minas, dos cancioneiros: hino
Pus-me a crescer menino

Confundido com peça de carro em chacota
Fui ser para sempre Carlota

E fui Projeto mais adiante
Era meu nome mais mil variantes

(...)

Sejam mais sonhos ou menos
Importam!
São meus

Inda que acaso não venham
Vieram
Em Deus!

NÃO SE TRATA APENAS DE A BÍBLIA SER INSPIRADA OU NÃO...


Sou só eu, ou você também se alegra - e muito! - quando, depois de dizer algo, algumas vezes, e não ser devidamente compreendido, ou nem considerado, você vê outra pessoa, talvez com mais graça de Deus e, certamente, num momento mais oportuno, dizer as mesmas coisas, e ser ouvido!

Como é bom, não?

Sim, é possível que, lá no fundinho, você se sinta um tanto quanto vingado (somos mesmo uma grande carniça!), mas... Para o inferno com nossas motivações! Importa é a glória de Deus!

E, neste aspecto, Deus foi glorificado naquele momento!

Pois bem.

Dias atrás, lhes trouxe aqui um vídeo com uma mensagem de Paul Washer, lembram?

Graças ao Vini, hoje conheci mais uma de suas ministrações.

Mais um alento para as almas sinceras, mas aflitas com os dias sombrios que a Igreja vive hoje.

E um pouco mais de comichão para os ouvidos frouxos dos humanistas cristãos.

Senhoras e senhores, mais uma vez... O Sr. Paul David Washer!




DUAS MANEIRAS DE SE FALAR COM DEUS



Em 1980, Gilberto Gil escreveu, a pedido de Roberto Carlos, a música “Se eu quiser falar com Deus”, considerada um clássico da nossa música popular, e que foi imortalizada, posteriormente, na voz de Elis Regina e do próprio Gil.

No livro intitulado “Gilberto Gil – Todas as Letras” (Cia. das Letras - Ed. Schwarcz, editado em 1996, organizado por Carlos Rennó), Gil revelou como foi a concepção da música:

“O Roberto (Carlos) me pediu uma canção: ‘Do que eu vou falar? Ele é tão religioso - e se eu quiser falar com Deus? E se eu quiser falar de falar com Deus?’ Com esses pensamentos e inquirições feitas durante uma sesta, dei início a uma exaustiva numeração: se eu quiser falar com Deus tenho que isso, tenho que aquilo, que aquilo outro. E saí. À noite voltei e organizei as frases em três estrofes”

Eis abaixo música e letra, para se rememorar ou simplesmente conhecer:

 



SE EU QUISER FALAR COM DEUS
Gilberto Gil (1980)

Se eu quiser falar com Deus tenho que ficar a sós
Tenho que apagar a luz, tenho que calar a voz
Tenho que encontrar a paz, tenho que folgar os nós
Dos sapatos, da gravata, dos desejos, dos receios,
Tenho que esquecer a data, tenho que perder a conta
Tenho que ter mãos vazias, ter a alma e o corpo nus

Se eu quiser falar com Deus tenho que aceitar a dor
Tenho que comer o pão que o diabo amassou
Tenho que virar um cão, tenho que lamber o chão
Dos palácios, dos castelos suntuosos do meu sonho
Tenho que me ver tristonho, tenho que me achar medonho
E apesar de um mal tamanho alegrar meu coração

Se eu quiser falar com Deus tenho que me aventurar
Tenho que subir aos céus sem cordas pra segurar
Tenho que dizer adeus, dar as costas, caminhar
Decidido pela estrada que ao findar vai dar em nada,
Nada, nada, nada, nada,
Nada, nada, nada, nada,
Nada, nada, nada, nada,
Do que eu pensava encontrar

Sobre a resposta de Roberto, o próprio Gil confessou:

“O que chegou a mim como tendo sido a reação dele, Roberto Carlos, foi que ele disse que não era a idéia de Deus que ele tem.”

Mas esclareceu:

“Ali, a configuração não é a de um deus nítido, com um perfil claro, definido. A canção (mais filosófica, nesse sentido, do que religiosa) não é necessariamente sobre um deus, mas sobre a realidade última: o vazio de Deus - o vazio-Deus."

Se for mesmo assim, o que só Deus sabe de fato, além de admirar a beleza melódica e harmônica da música, tenho que assumir, por este prisma, minha cumplicidade à idéia de Gil.

Sobre isto também, a jornalista, escritora e pastora metodista, Hideíde Brito Torres, de Cataguases/MG, fez em seu blog “PALAVRA(S)” uma leitura que me pareceu absolutamente coerente da música, e que se funde bem aos argumentos de Gil.

Mas talvez a grande maioria dos cristãos sentiu-se mesmo foi ultrajada com o estereótipo criado pela letra da música de Gilberto Gil, por interpretá-las ofensivas à natureza de Deus, o Único Deus Verdadeiro.

O grande músico e compositor Carlos Sider foi um dos que, segundo ele mesmo diz, sentiram-se incomodados com as palavras do músico baiano.

Em suas próprias palavras, o que Sider disse foi:


“Francamente, confesso que sempre sofri com esta música do Gil. Primeiro, obviamente, por conta da letra. Eu já conhecia pessoalmente a Deus, me relacionava com Ele, quando a música apareceu nas rádios. Não podia entender como alguém desejava apresentar o Deus pessoal que eu conhecia naquela imagem disforme de qualquer coisa, menos o verdadeiro Deus.

Mas, em segundo lugar, sofria porque gostava (e continuo gostando) da melodia e da harmonia. De um lado eu queria aprender a tocá-la. De outro, queria esquecer dela.”


Então, genialmente, como tinha de ser, e 10 anos após, Sider escreveu-lhe uma resposta, bem à altura, e na mesma moeda, compondo, produzindo e cantando uma música que falava da realidade fática daqueles que seguem a Deus.

A canção, chamada “Resposta a Gil”, está no belíssimo CD “Frutos de Vida II”, lançado em 1996, e é ela que eu lhes apresento hoje aqui.

Clique, ouça e acompanhe:


 



RESPOSTA A GIL
Carlos Sider (1990)

Se eu quiser falar a um simples deus qualquer
Desses que a mente sempre vai criar
Desses que aos milhares vem se ofertar
Sujo espelho de quem quis ser, mas não será

Nobre amigo, tenho então de concordar
Com tuas notas, teus acordes, o teu triste cantar
Dura estrada, trilha errada,
Longa saga de alta paga
Que ao fim dá mesmo em nada, nada, nada, nada, nada
Nada...

Mas se eu for falar com nada mais que Deus
Não preciso nem sequer me concentrar
Nem de longe tenho que me flagelar
Sua voz me fala antes que eu venha a falar

Nobre amigo, nem sequer O procurei
Fui achado, resgatado, me bastou que escutei
E Ele é a vida desejada,
Mais que achada, ofertada,
Ele é tudo, tudo em mim,
Ele é tudo, tudo em mim,
Ele é tudo, tudo em mim

Muitas vezes já falei com Deus...


Duas belíssimas músicas...

E um só Deus.

Bem descrito ou não...

Deus.

E Ele, para mim, basta.

SER O SEGUNDO OFENDE?*

* Por Antônio João Arthuso Lima


Por ocasião do batismo de Jesus, houve entre João, o Batista, e o nosso Mestre, uma breve disputa pelo segundo lugar. De um lado João não se via à altura de batizar o próprio criador do batismo, bem como de todas as outras coisas. De outro lado o criador de todas as coisas, não queria se aferrar no ser Quem era. Porém, quando Jesus cita a necessidade de se fazer assim para que as Escrituras fossem cumpridas, João, com relutância se colocou em posição mais "honrosa".

Em dado momento, Jônatas filho do Rei Saul e herdeiro direto do trono, declara-se segundo, servo, de um Davi. Sua afirmação de que seria o segundo e Davi seria o Rei, foi uma demonstração clara do quanto havia em seu coração o desejo de honrar seu amigo.


“E partiu Barnabé para Tarso à procura de Saulo;
tendo-o encontrado, levou-o para Antioquia.
E, por todo um ano, se reuniram naquela igreja e ensinaram numerosa multidão.
Em Antioquia, foram os discípulos, pela primeira vez, chamados cristãos.”
(Atos 11:25,26)


Em Antioquia, o Espírito de Deus estava levando muitos ao arrependimento. Tamanha era a obra de Deus, que seu impacto chegou “aos ouvidos” da Igreja em Jerusalém. Barnabé, enviado para inspecionar, assistir o mover de Deus naquela cidade, percebeu a necessidade de ter mais alguém consigo naquela tarefa. Ao buscar Saulo, em Tarso, Barnabé abriu caminho para que aquele homem, antes perseguidor, se tornasse um grande e marcante líder do cristianismo. Barnabé não se aferrou em ser o homem enviado pelos presbíteros de Jerusalém, não usou sua fama de homem íntegro e cheio do Espírito Santo, apenas se colocou onde Deus o queria.

“Refiro-me ao fato de cada um de vós dizer:
Eu sou de Paulo, e eu, de Apolo, e eu, de Cefas, e eu, de Cristo.”
(1 Corintios 1:12)


A igreja quer ser de Paulo, de Pedro, de Apolo e de Jesus, mas será que ela desejaria ser de Barnabé, João Batista ou de Jônatas?

Tantos querem falar, estar à frente, subir até mesmo em púlpitos invisíveis (quando não conseguem ser apenas intercessores, mas, se aferram em ser proclamadores, faladores). Por que é tão difícil para alguns se conterem em silenciosa contemplação e oração principalmente nos momentos em que outro irmão já está ministrando? Por que para alguns, parece que ser o segundo é deixar que o outro apareça mais? Isto ofende?

Será que sempre o Espírito Santo quer usar tal irmão para ministrar ou ele é apenas um papagaio treinado em escrituras e movido pela ansiedade de falar, falar, falar...

Penso que eu posso cooperar muito com Deus em diversos momentos, me guardando em silêncio. Jesus não é a voz do mundo e sim a luz. Em silêncio posso pregar um evangelho que me custará muito mais caro do que encher alguém com informações acerca de Evangelho do Reino. A mais transformadora pregação de Jesus acerca do Evangelho do Reino foi em silêncio, dependurado em um madeiro.

Quando eu morro, me silencio, permito que o Espírito faça e eu assista, e quando sou o falador do Reino, fico na verdade tentando fazer, para que o Espírito Santo assista.

Vai ser muito gostoso ser o segundo.

Com carinho,

Antônio João**


**Antônio João é um amigo particular deste blogueiro e sincero cooperador da obra de Deus em Betim/MG.

REESCREVENDO MARCOS 16:16



Pela teologia católica, o batismo salva a todos, motivo pelo qual se faz urgente a necessidade de batizar-se o quanto antes, ainda criança.

Quanto a crer, cada um pode fazer sua opção mais tarde, mediante a Crisma e os demais sacramentos, como a Confissão, a Primeira Comunhão e a Eucaristia, etc.

Por isso, Marcos 16:16, com base na prática católica, seria escrito assim:


“Quem se batizar e for salvo, poderá vir a crer”
(São Marcos 16:16)


Por sua vez, a teologia evangélica indica que a fé é que salva a todos, motivo pelo qual se faz urgente a necessidade de crer logo (ou “aceitar a Jesus”, como dizem).

E quanto a batizar-se, isso pode ser feito depois, quando o prosélito estiver sentindo-se mais preparado, ou já estiver caminhando há algum tempo.

Tamanha é superfluidade do batismo que, não estar batizado, não é impeditivo algum à sua participação nos sacramentos, como a Ceia do Senhor (a mesma Eucaristia dos católicos), por exemplo, ou as demais liturgias eclesiásticas diversas, sejam elas de que denominação for.

De maneira que Marcos 16:16, com base na prática evangélica, ficaria mais ou menos assim:

“Quem crer e for salvo, poderá se batizar”
(Irmão Marcos 16:16)

Que dizem as Escrituras?

Ora, que a teologia católica está certa, mas a prática errada, por desvincular o batismo da fé, majorando o primeiro e minorando o segundo, o que, claro!, compromete tudo.

Mas, já no caso dos evangélicos, sua teologia é que está errada, e sua prática certa, pois eles fazem exatamente o contrário dos católicos, desvinculando a fé do batismo. E isto, idem, compromete tudo.

O melhor a ser feito, porém, é pegarmos a teologia católica e juntarmos à prática evangélica, e teremos, então, o batismo bíblico, real, prático e inapelável, e que está, há séculos, bem explicado no verdadeiro texto de Marcos 16:16:

“Quem crer e for batizado, será salvo”

E esta era mesmo a prática da Igreja Primitiva em Atos, onde encontramos nove - isto mesmo - nove exemplos de batismos, quase todos imediatos à conversão pela fé. E quase todos porque só um - isto mesmo - só um deles, o de Paulo, demorou um pouco mais: três - isto mesmo - três dias.

Mesmo assim, Ananias, depois de ouvir a Paulo, lhe exorta, dando a exata noção de urgência que lhe faltava (e que nós negamos tão placidamente aos outros):

"E agora, por que te demoras?
Levanta-te, recebe o batismo e lava os teus pecados,
invocando o nome d'Ele"
(Atos 22:16)

E olhe que eram apenas três dias, hein!

Em resumo, o batismo salva, sim (1Pe. 3:21), e, por causa disso mesmo, precisa ser imediato, por imprescindível que é. Mas ele jamais pode estar alijado da fé em Cristo, pelo simples fato de não existir sem esta.

Só haverá batismo se houver fé em Cristo.

E a fé legítima conduz sempre ao batismo.

Quando se diz, na seqüência, que quem não crê está condenado, é porque, obviamente, quem não crê não estará batizado, mesmo que tenha sido quando ainda criança; e nem será batizado, mesmo que seja mergulhado em água depois.

Amém.


SE ESTA FOSSE A SUA HORA...

... e você tivesse que escolher entre uma dessas portas, sabendo que só uma delas te conduzirá à vida eterna, enquanto a outra te levará à perdição eterna, mas você não sabe exatamente qual...


... qual delas escolheria?

OS FALSOS PROFETAS



Alguns personagens bíblicos são altamente influentes.

Infelizmente nem todos de boa índole.

Mas pior seria se passassem despercebidos.

Pois, pelo menos, um deles passa, às vezes, e tem livre acesso entre nós hoje. Livre ou porque o ignoramos, fazendo de conta de que simplesmente não está aqui, ou porque somos nós os ignorantes quanto a ele, desconhecendo-lhe completamente a existência.

Da parte do blog, porém, e daqui pra frente, quem quiser se desculpar só encontrará uma alternativa: a de fazer vistas grossas, e fingir que não é com ele. Porque ninguém, pelo menos daqueles que passam por aqui, vai poder dizer que “isto não existe”.

O que faz de alguém um profeta? Seu tom de voz? Sua capacidade de eloqüência? O dom de predizer o futuro? A imposição de mãos de alguém?


Nada disto.

Claro que isto tudo pode haver (e em muitos casos há), mas o que faz de alguém um profeta é nada mais, nada menos que...

DEUS!

Um profeta fala em nome de Deus. E este “em nome de...” aqui não é mera pronunciação repetitiva de algo, ou a evocação de um espírito, mas uma representação. “Em nome de Deus” significa “representando Deus”, o que equivale dizer que se Deus estivesse aqui, em Pessoa, Ele estaria falando exatamente o que o profeta está falando.

Por associação, o que faz de alguém um falso profeta é o fato de este não falar da parte de Deus, mas de qualquer um (inclusive, ele próprio).

E disto está cheio por aí!

Eu não estou falando de orar antes de uma pregação! Isto definitivamente não é garantia de que aquilo que você vai falar vem de Deus. Eu estou falando de só abrir a boca para falar o que Deus quiser falar, e quando quiser falar (mesmo que seja bíblico).

Você sabe qual é talvez a maior característica de um falso profeta?

O falso profeta não é aquele que fala mentiras.

O falso profeta é aquele que fala o que as pessoas querem ouvir.

Essa é a explicação por que ele enganará a muitos (se possível até os eleitos).

Ora, quem é que vai na onda de um mentiroso descarado e deslavado?

Ah, mas é muito fácil ir atrás de um bajulador, de um sedutor, de alguém que só diz coisas agradáveis a respeito de tudo, inclusive de você, que tem o poder da persuasão, que é convincente, articulado, inteligente, que tem bons argumentos, sensatez... Ah, como é bom alguém assim!

Isto satisfaz nosso ego, atende aos nossos anseios e, claro!, não nos reprova.

Alguém que diz que tudo o que eu faço está bom, o que importa é o coração, é minha boa intenção, afinal, Deus é amor!

“Oh, glória!”

O falso profeta é falso porque fala em nome de si mesmo, em nome de sua reputação, em nome de sua imagem, em nome de sua denominação, em nome de sua arrecadação mensal, em nome de sua popularidade entre os homens, em nome de sua integridade física e moral, em nome de tudo isto... Menos de Deus!

Ele diz que é em nome de Deus. Mas se o próprio diabo se transforma em anjo de luz...

Às vezes, tenho a impressão de que os cristãos desse lado, especialmente os desse lado da Terra, seguem tranqüilamente seu destino, como se no final fossem tão somente se deparar com dois grandes portões; um onde está escrito “Céu”, e outro onde se lê “Inferno”. E apenas tivessem que escolher.

“Ah, desculpe. É por ali que eu vou. Com licença, sim?!”

“Não, espere! Eu também vou pra lá!”

“Ah, que ótimo! Assim podemos seguir conversando...”


E não há nada com o que se preocupar.

O diabo não se preocupa se você prega muito ou se ouve muitas pregações. O que realmente importa é O QUE você prega, O QUE você ouve e, sobretudo, SE VOCÊ VIVE isto que prega e/ou ouve.

Hoje em dia, há muitos “pregadores dos interesses dos homens” arrebanhando multidões de pessoas, julgando-se bem sucedidos na obra do Senhor.

Mas quantos os seguiriam, se esses homens lhes dissessem o que aquelas pessoas precisam, de fato, ouvir?

Se dissessem abertamente, por exemplo, aos casados que jamais, repito, jamais devem divorciar-se, mas amarem-se como Cristo ama a Igreja e vice-versa.

Ou dissessem aos divorciados que jamais, repito, jamais devem casar-se novamente, senão reconciliar-se com seus respectivos cônjuges ou viverem sozinhos.

Se dissessem aos jovens que jamais, repito, jamais devem defraudar-se mutuamente, provocando uns nos outros desejos e sentimentos que não podem satisfazer, e que Deus reservou apenas, repito, apenas para os casados.

Quantos os seguiriam?

Quantos de vocês os seguiriam?

Vamos falar um pouquinho das roupas que as irmãzinhas usam nas reuniões? Não, né?!

Que tal falarmos dos programas que você assiste? Dos filmes que você aluga? Dos sites que você visita? Também não?

Quem sabe falemos um pouco sobre sua declaração de imposto de renda, então? Ou sobre suas responsabilidades para com aqueles que lhe são credores? Não?

Melhor mudar de assunto.

Falemos de amor.

“Ah, o amor!”

Vamos falar de perdão para tudo o que você fizer (mesmo voluntariamente), de felicidade plena em todas as áreas da vida, de prosperidade financeira e profissional, de sucesso (no jogo e no amor), de vitória sobre todas as coisas, de cura sobre todas as doenças, afinal, você é lindo(a), você é dez (não tinha uma música assim, do Grupo Gerd?), você nasceu para ser cabeça e não cauda, você merece ser feliz, você é “o cara”...
Menos talvez para o Obama!

Eu tenho dito, irmãos, inclusive aqui, e reiteradas vezes, que atualmente as pessoas não precisam mais se converter. E completo: “Basta que procurem bem”.

Tem igreja, ou religião, ou “Deus” para todo mundo, para todos os gostos.

Não nego que Deus nos aceite do jeito que somos. Mas Deus jamais nos aceitará se continuamos do jeito que somos.

Mas hoje, se alguém “é de um jeito” e se lhe custa muito, digamos, “mudar” (“se converter” seria o termo – já que “conversão” é mesmo mudar a direção – mas achei forte demais)...

“Dê mais uma volta, rapaz! Não tenha pressa. Tá cheio de gente por aí que vai lhe dizer exatamente o que você quer ouvir”.

Aliás, Paulo já havia previsto a chegada de um tempo assim:


“Pois haverá tempo em que não suportarão a sã doutrina; pelo contrário, cercar-se-ão de mestres segundo as suas próprias concupiscências, como que sentindo coceira nos ouvidos; e se recusarão a dar ouvidos à verdade, entregando-se às fábulas.”
(II Timóteo 4:3,4)

E aqui estamos nós.

Este é o seu tempo.

Mas, por acaso, é esta também a sua escolha?

PAUL WASHER


Você precisa ver isto...



A VESPA (ou "A IGREJA QUE VAI PARA O INFERNO")




Este artigo pode parecer ter vindo da idéia do post anterior.

Não!

Ele foi publicado em outubro de 2007, num outro blog que eu mantinha até então.

Mas é claro que ter postado Machado de Assis aqui me encorajou a repeti-lo.

Dessa vez, no entanto, dei uma repaginada nele, especialmente para que ficasse mais enxuto (grande demais que era).

Espero que gostem, apesar de não gostarem (como se verá).

Pois bem.

Este bichinho simpático aí em cima é uma vespa.

Seu nome é Ichneunomidae.

As vespas Ichneunomidae são uma família de vespas parasitas e ovopositoras, o que significa que elas colocam seus ovos dentro das larvas de outros insetos, ou até mesmo dentro dos próprios insetos.

Feito isto, as larvas dessas parasitas desenvolvem-se dentro do hospedeiro, que geralmente conseguem viver ainda por algum tempo depois.

Quando você olha, o que vê é o hospedeiro.

Mas, de repente, ele dá um treco. Cai e morre.


É quando, dali a pouco, você deverá ver sair de dentro do pobre inseto morto a vespinha filhote, uma Ichneunomidaezinha tímida, inocente e inofensiva, não fosse uma assassina voraz.

Mas essa é a mãe-natureza, e sua beleza maravilhosa, e sua riqueza incalculável, projetada, arquitetada e executada pela mente e mãos do Criador do Universo.

Não há com o que se entristecer afinal, senão louvar.

Ora, mas vejam só que estratégia fantástica a dessa vespinha, não? Que técnica apurada! Ela provê moradia segura e alimento farto a seus filhotes por longo tempo, o que, certamente, não seria tão fácil conseguir em condições normais de ambiente, tão expostos ficariam os pequenos.

Agora imagine o que deve ser isto: infiltrar um aliado no terreno do inimigo.

A estratégia, inclusive, deve ser milenar, mas seu poder de destruição será sempre, sem dúvida, assustador.

Os que viram hão de se lembrar, por exemplo, do filme “Os Infiltrados”, com Jack Nicholson, Leonardo di Caprio e Matt Damon.

Aos que não viram, entretanto, sugiro que não vejam.

É que o filme, em si, é bom, mas não sei se valeria a pena ver e ler tanto lixo que virá junto com ele. Mas...

Bem, voltemos ao nosso assunto aqui.

Acredito que, da mesma maneira que a vespinha assassina acima, há um espírito maligno que foi depositado dentro da Igreja, e que vai comendo e crescendo dentro dela, e esperando paciente e confortavelmente até que esta morra em definitivo.

Quando você olha, o que vê é a Igreja.

Mas há uma vespinha dos infernos lá dentro, distante dos olhos, mas perto do coração.

O que estou dizendo aqui não é necessariamente novo. Jesus nos alertou sobre isto quando falou sobre o joio, que deveria ser deixado lá, junto do trigo, e – o que mais preocupa – crescendo com ele (Mateus 13:25-40).

Jesus disse também que lobos se vestiriam em peles de cordeiros, e se infiltrariam entre nós (Mateus 7:15; Atos 20:29).

E há ainda o triste testemunho de Judas, coitado. Discípulo do Senhor, enviado junto aos setenta, que viu tantos milagres, que participou de tanta coisa ao lado do Senhor... Mas era o filho da perdição (João 17:12).

Não sei se estou sendo claro.

Eu não estou falando de “ímpios-ímpios”.

Estou falando daqueles que Jesus citou em uma de suas parábolas, os perplexos, que, no último dia, dirão: “Senhor, Senhor!”, mas a quem, entretanto, o Senhor nunca conheceu (Mateus 7:21-23).

Estou falando de gente como a gente, com a aparência da gente, práticas como as da gente, e que – por isto mesmo – pode até ser a gente mesmo então! Por que não?

Vejamos outro caso bem conhecido: os fariseus.

Eles oravam.

Eles jejuavam.

Eles conheciam as Escrituras (ou o que havia delas naquela época, né?!).

Eles davam seus dízimos também (de maneira até mais aplicada do que nós).

E eles iam ao templo freqüentemente.

Com quem se pareciam?

Com o seu vizinho, imoral? Com uma prostituta? Com um bandido?

Não!

Doa isto em você ou não, os fariseus, piores adversários de Jesus, por essas características, se pareciam era conosco, os que afirmamos seguir ao Senhor.

Portanto, por ora, mesmo que à contragosto, isto não nos exclui nem nos exime, em princípio.

Então, por enquanto, isto aqui diz respeito a nós também. Nossa piedade pode bem ser aparente. É possível. Os fariseus tinham uma aparente piedade.

Você se gaba de seguir a Cristo? Pois eu lhe digo: hoje é fácil. Agora é mais simples. Afinal, você conhece o fim da história.

Queria ver antes, quando a história ainda estava sendo escrita, o que você faria: se ia lançar-se aos pés de Jesus e segui-Lo para sempre, ou se ia ficar do lado dos fariseus, com sua piedadezinha faz-de-conta, sua moralzinha alta.

Sim, porque Jesus foi um homem chocante!

Ou o que você faria se soubesse que havia um homem que se auto-denominava “o Filho de Deus” e que realizava milagres, maravilhas e sinais por aí, mas, ao sair de casa um dia, você o visse dentro de um bar, cercado de homens de baixa reputação na sociedade e de prostitutas, e – pior – bebendo e comendo com eles? O que você faria? Hã?

Seja sincero. Avalie sua primeira disposição mental, seu primeiro pensamento, seu “justo julgamento”. Olhe pra dentro de si e me diga: o que pensaria daquele homem?

“Hunpf... Filho de Deus?! Filho do demônio, isto sim!”

Agora veja o que diziam os fariseus à respeito d’Ele (Mateus 9:11, 34; 11:19; 12:24-28; Marcos 2:16; 3:22; Lucas 5:30; 7:34; 11:15-20; João 7:20; 8:48-52; 10:20, 21).

Com quem se parecem?

Com quem você se parece?

Talvez alguns digam: “Não! Eu seguiria a Jesus mesmo assim”. Eu digo: “Amém! Tomara, meu irmão!”, porque agora sabemos de Quem se tratava aquele Homem. Mas para os religiosos da época, os que acreditavam, assim como nós, seguir a Deus... Ele era bem estranho. No mínimo.

O Evangelho do Reino de Deus não tem a forma que damos a ele. Não é de sucessos, como muitos querem nos fazer pensar. O Reino de Deus é tomado por esforço (Lucas 16:16). O Evangelho é de perda (Lucas 14:33), de abandono (Lucas 14:26) e de sofrimento (Filipenses 1:29). A porta é estreita e poucos – repito – poucos são os que acertam por ela (Mateus 7:13; Lucas 13:24).

Hoje em dia, há muitos outros evangelhos. Mas todos são anátemas (Gálatas 1:8, 9)! Malditos!

A Igreja de hoje (genericamente falando) é mundana.

Está preocupada com o bem-estar dos irmãos, em não ofendê-los, não contrariá-los. E vai lhes dizendo aquilo que querem ouvir. E vai permitindo coisas que são abomináveis aos olhos puros do Senhor. Aos poucos, os irmãos, que deveriam ser jardim fechado, plantado e regado pelo Senhor (Isaías 58:11), estão muito mais parecidos é com o mundo.

Copiamos o mundo em tudo.

Mas Jesus é Quem deveria ser nosso modelo! É a Ele que deveríamos copiar, ainda que isto seja retrô demais, velho demais ou radical demais.

Mas para não sermos antiquados demais, vamos nos modernizando, e dizendo que o contexto hoje é outro (tentando convencer a nós mesmos de tamanha – e tacanha – besteira), e vamos copiando o mundo, nos parecendo mais com ele... E herdando também, claro, mais e mais, e naturalmente, o lugar da perdição eterna para onde ele vai.

O que acontece se colocamos um pouco de barro num litro ou dois de água limpa? Hã? O barro vai se limpar? Não! É claro que não. A água vai se sujar. Muito ou pouco, se sujará!

É esta, talvez, a mais eficaz estratégia usada por satanás: infiltrar valores corrompidos e macular (ou tentar macular) a imagem santa da Igreja de Jesus.

Temos por Ele, entretanto, a promessa de não sermos confundidos (Isaías 45:17; Romanos 9:33; 10:11). Mas convém-nos temer.

Em princípio, nenhum de nós deve se contentar pelo simples fato de acharmos que somos do Senhor. Precisamos ter certeza! Porque se achamos apenas, podemos não ser, e nosso fim seria assustador neste caso. Terrível, pra dizer a verdade!

Amados, é pelos frutos que se conhece uma árvore (Mateus 12:33).

p.s.: Como vêem, continou grande o artigo, mas...


A IGREJA DO DIABO*


*Por Machado de Assis (1839-1908)

Capítulo I
De uma idéia mirífica


Conta um velho manuscrito beneditino que o Diabo, em certo dia, teve a idéia de fundar uma igreja. Embora os seus lucros fossem contínuos e grandes, sentia-se humilhado com o papel avulso que exercia desde séculos, sem organização, sem regras, sem cânones, sem ritual, sem nada. Vivia, por assim dizer, dos remanescentes divinos, dos descuidos e obséquios humanos. Nada fixo, nada regular. Por que não teria ele a sua igreja? Uma igreja do Diabo era o meio eficaz de combater as outras religiões, e destruí-las de uma vez.

— Vá, pois, uma igreja, concluiu ele. Escritura contra Escritura, breviário contra breviário. Terei a minha missa, com vinho e pão à farta, as minhas prédicas, bulas, novenas e todo o demais aparelho eclesiástico. O meu credo será o núcleo universal dos espíritos, a minha igreja uma tenda de Abraão. E depois, enquanto as outras religiões se combatem e se dividem, a minha igreja será única; não acharei diante de mim, nem Maomé, nem Lutero. Há muitos modos de afirmar; há só um de negar tudo.

Dizendo isto, o Diabo sacudiu a cabeça e estendeu os braços, com um gesto magnífico e varonil. Em seguida, lembrou-se de ir ter com Deus para comunicar-lhe a idéia, e desafiá-lo; levantou os olhos, acesos de ódio, ásperos de vingança, e disse consigo:

— Vamos, é tempo. E rápido, batendo as asas, com tal estrondo que abalou todas as províncias do abismo, arrancou da sombra para o infinito azul.

Capítulo II
Entre Deus e o Diabo

Deus recolhia um ancião, quando o Diabo chegou ao céu. Os serafins que engrinaldavam o recém-chegado, detiveram-se logo, e o Diabo deixou-se estar à entrada com os olhos no Senhor.

— Que me queres tu? perguntou Este.
— Não venho pelo vosso servo Fausto, respondeu o Diabo rindo, mas por todos os Faustos do século e dos séculos.
— Explica-te.
— Senhor, a explicação é fácil; mas permiti que vos diga: recolhei primeiro esse bom velho; dai-lhe o melhor lugar, mandai que as mais afinadas cítaras e alaúdes o recebam com os mais divinos coros...
— Sabes o que ele fez? perguntou o Senhor, com os olhos cheios de doçura.
— Não, mas provavelmente é dos últimos que virão ter convosco. Não tarda muito que o céu fique semelhante a uma casa vazia, por causa do preço, que é alto. Vou edificar uma hospedaria barata; em duas palavras, vou fundar uma igreja. Estou cansado da minha desorganização, do meu reinado casual e adventício. É tempo de obter a vitória final e completa. E então vim dizer-vos isto, com lealdade, para que me não acuseis de dissimulação... Boa idéia, não vos parece?
— Vieste dizê-la, não legitimá-la, advertiu o Senhor.
— Tendes razão, acudiu o Diabo; mas o amor-próprio gosta de ouvir o aplauso dos mestres. Verdade é que neste caso seria o aplauso de um mestre vencido, e uma tal exigência... Senhor, desço à terra; vou lançar a minha pedra fundamental.
— Vai.
— Quereis que venha anunciar-vos o remate da obra?
— Não é preciso; basta que me digas desde já por que motivo, cansado há tanto da tua desorganização, só agora pensaste em fundar uma igreja.

O Diabo sorriu com certo ar de escárnio e triunfo. Tinha alguma idéia cruel no espírito, algum reparo picante no alforje de memória, qualquer coisa que, nesse breve instante de eternidade, o fazia crer superior ao próprio Deus. Mas recolheu o riso, e disse:

— Só agora concluí uma observação, começada desde alguns séculos, e é que as virtudes, filhas do céu, são em grande número comparáveis a rainhas, cujo manto de veludo rematasse em franjas de algodão. Ora, eu proponho-me a puxá-las por essa franja, e trazê-las todas para minha igreja; atrás delas virão as de seda pura...
— Velho retórico! murmurou o Senhor.
— Olhai bem. Muitos corpos que ajoelham aos vossos pés, nos templos do mundo, trazem as anquinhas da sala e da rua, os rostos tingem-se do mesmo pó, os lenços cheiram aos mesmos cheiros, as pupilas centelham de curiosidade e devoção entre o livro santo e o bigode do pecado. Vede o ardor, — a indiferença, ao menos, — com que esse cavalheiro põe em letras públicas os benefícios que liberalmente espalha, — ou sejam roupas ou botas, ou moedas, ou quaisquer dessas matérias necessárias à vida... Mas não quero parecer que me detenho em coisas miúdas; não falo, por exemplo, da placidez com que este juiz de irmandade, nas procissões, carrega piedosamente ao peito o vosso amor e uma comenda... Vou a negócios mais altos...

Nisto os serafins agitaram as asas pesadas de fastio e sono. Miguel e Gabriel fitaram no Senhor um olhar de súplica. Deus interrompeu o Diabo.

— Tu és vulgar, que é o pior que pode acontecer a um espírito da tua espécie, replicou-lhe o Senhor. Tudo o que dizes ou digas está dito e redito pelos moralistas do mundo. É assunto gasto; e se não tens força, nem originalidade para renovar um assunto gasto, melhor é que te cales e te retires. Olha; todas as minhas legiões mostram no rosto os sinais vivos do tédio que lhes dás. Esse mesmo ancião parece enjoado; e sabes tu o que ele fez?
— Já vos disse que não.
— Depois de uma vida honesta, teve uma morte sublime. Colhido em um naufrágio, ia salvar-se numa tábua; mas viu um casal de noivos, na flor da vida, que se debatiam já com a morte; deu-lhes a tábua de salvação e mergulhou na eternidade. Nenhum público: a água e o céu por cima. Onde achas aí a franja de algodão?
— Senhor, eu sou, como sabeis, o espírito que nega.
— Negas esta morte?
— Nego tudo. A misantropia pode tomar aspecto de caridade; deixar a vida aos outros, para um misantropo, é realmente aborrecê-los...
— Retórico e sutil! exclamou o Senhor. Vai, vai, funda a tua igreja; chama todas as virtudes, recolhe todas as franjas, convoca todos os homens... Mas, vai! vai!

Debalde o Diabo tentou proferir alguma coisa mais. Deus impusera-lhe silêncio; os serafins, a um sinal divino, encheram o céu com as harmonias de seus cânticos. O Diabo sentiu, de repente, que se achava no ar; dobrou as asas, e, como um raio, caiu na terra.

Capítulo III
A boa nova aos homens

Uma vez na terra, o Diabo não perdeu um minuto. Deu-se pressa em enfiar a cogula beneditina, como hábito de boa fama, e entrou a espalhar uma doutrina nova e extraordinária, com uma voz que reboava nas entranhas do século. Ele prometia aos seus discípulos e fiéis as delícias da terra, todas as glórias, os deleites mais íntimos. Confessava que era o Diabo; mas confessava-o para retificar a noção que os homens tinham dele e desmentir as histórias que a seu respeito contavam as velhas beatas.

— Sim, sou o Diabo, repetia ele; não o Diabo das noites sulfúreas, dos contos soníferos, terror das crianças, mas o Diabo verdadeiro e único, o próprio gênio da natureza, a que se deu aquele nome para arredá-lo do coração dos homens. Vede-me gentil e airoso. Sou o vosso verdadeiro pai. Vamos lá: tomai daquele nome, inventado para meu desdouro, fazei dele um troféu e um lábaro, e eu vos darei tudo, tudo, tudo, tudo, tudo, tudo...

Era assim que falava, a princípio, para excitar o entusiasmo, espertar os indiferentes, congregar, em suma, as multidões ao pé de si. E elas vieram; e logo que vieram, o Diabo passou a definir a doutrina. A doutrina era a que podia ser na boca de um espírito de negação. Isso quanto à substância, porque, acerca da forma, era umas vezes sutil, outras cínica e deslavada.

Clamava ele que as virtudes aceitas deviam ser substituídas por outras, que eram as naturais e legítimas. A soberba, a luxúria, a preguiça foram reabilitadas, e assim também a avareza, que declarou não ser mais do que a mãe da economia, com a diferença que a mãe era robusta, e a filha uma esgalgada. A ira tinha a melhor defesa na existência de Homero; sem o furor de Aquiles, não haveria a Ilíada: "Musa, canta a cólera de Aquiles, filho de Peleu..." O mesmo disse da gula, que produziu as melhores páginas de Rabelais, e muitos bons versos de Hissope; virtude tão superior, que ninguém se lembra das batalhas de Luculo, mas das suas ceias; foi a gula que realmente o fez imortal. Mas, ainda pondo de lado essas razões de ordem literária ou histórica, para só mostrar o valor intrínseco daquela virtude, quem negaria que era muito melhor sentir na boca e no ventre os bons manjares, em grande cópia, do que os maus bocados, ou a saliva do jejum? Pela sua parte o Diabo prometia substituir a vinha do Senhor, expressão metafórica, pela vinha do Diabo, locução direta e verdadeira, pois não faltaria nunca aos seus com o fruto das mais belas cepas do mundo. Quanto à inveja, pregou friamente que era a virtude principal, origem de propriedades infinitas; virtude preciosa, que chegava a suprir todas as outras, e ao próprio talento.

As turbas corriam atrás dele entusiasmadas. O Diabo incutia-lhes, a grandes golpes de eloqüência, toda a nova ordem de coisas, trocando a noção delas, fazendo amar as perversas e detestar as sãs.

Nada mais curioso, por exemplo, do que a definição que ele dava da fraude. Chamava-lhe o braço esquerdo do homem; o braço direito era a força; e concluía: Muitos homens são canhotos, eis tudo. Ora, ele não exigia que todos fossem canhotos; não era exclusivista. Que uns fossem canhotos, outros destros; aceitava a todos, menos os que não fossem nada. A demonstração, porém, mais rigorosa e profunda, foi a da venalidade. Um casuísta do tempo chegou a confessar que era um monumento de lógica. A venalidade, disse o Diabo, era o exercício de um direito superior a todos os direitos. Se tu podes vender a tua casa, o teu boi, o teu sapato, o teu chapéu, coisas que são tuas por uma razão jurídica e legal, mas que, em todo caso, estão fora de ti, como é que não podes vender a tua opinião, o teu voto, a tua palavra, a tua fé, coisas que são mais do que tuas, porque são a tua própria consciência, isto é, tu mesmo? Negá-lo é cair no absurdo e no contraditório. Pois não há mulheres que vendem os cabelos? não pode um homem vender uma parte do seu sangue para transfundi-lo a outro homem anêmico? e o sangue e os cabelos, partes físicas, terão um privilégio que se nega ao caráter, à porção moral do homem? Demonstrado assim o princípio, o Diabo não se demorou em expor as vantagens de ordem temporal ou pecuniária; depois, mostrou ainda que, à vista do preconceito social, conviria dissimular o exercício de um direito tão legítimo, o que era exercer ao mesmo tempo a venalidade e a hipocrisia, isto é, merecer duplicadamente.

E descia, e subia, examinava tudo, retificava tudo. Está claro que combateu o perdão das injúrias e outras máximas de brandura e cordialidade. Não proibiu formalmente a calúnia gratuita, mas induziu a exercê-la mediante retribuição, ou pecuniária, ou de outra espécie; nos casos, porém, em que ela fosse uma expansão imperiosa da força imaginativa, e nada mais, proibia receber nenhum salário, pois equivalia a fazer pagar a transpiração.

Todas as formas de respeito foram condenadas por ele, como elementos possíveis de um certo decoro social e pessoal; salva, todavia, a única exceção do interesse. Mas essa mesma exceção foi logo eliminada, pela consideração de que o interesse, convertendo o respeito em simples adulação, era este o sentimento aplicado e não aquele.

Para rematar a obra, entendeu o Diabo que lhe cumpria cortar por toda a solidariedade humana. Com efeito, o amor do próximo era um obstáculo grave à nova instituição. Ele mostrou que essa regra era uma simples invenção de parasitas e negociantes insolváveis; não se devia dar ao próximo senão indiferença; em alguns casos, ódio ou desprezo. Chegou mesmo à demonstração de que a noção de próximo era errada, e citava esta frase de um padre de Nápoles, aquele fino e letrado Galiani, que escrevia a uma das marquesas do antigo regime: "Leve a breca o próximo! Não há próximo!" A única hipótese em que ele permitia amar ao próximo era quando se tratasse de amar as damas alheias, porque essa espécie de amor tinha a particularidade de não ser outra coisa mais do que o amor do indivíduo a si mesmo. E como alguns discípulos achassem que uma tal explicação, por metafísica, escapava à compreensão das turbas, o Diabo recorreu a um apólogo:

— Cem pessoas tomam ações de um banco, para as operações comuns; mas cada acionista não cuida realmente senão nos seus dividendos: é o que acontece aos adúlteros. Este apólogo foi incluído no livro da sabedoria.

Capítulo IV
Franjas e franjas

A previsão do Diabo verificou-se. Todas as virtudes cuja capa de veludo acabava em franja de algodão, uma vez puxadas pela franja, deitavam a capa às urtigas e vinham alistar-se na igreja nova. Atrás foram chegando as outras, e o tempo abençoou a instituição. A igreja fundara-se; a doutrina propagava-se; não havia uma região do globo que não a conhecesse, uma língua que não a traduzisse, uma raça que não a amasse. O Diabo alçou brados de triunfo.

Um dia, porém, longos anos depois notou o Diabo que muitos dos seus fiéis, às escondidas, praticavam as antigas virtudes. Não as praticavam todas, nem integralmente, mas algumas, por partes, e, como digo, às ocultas. Certos glutões recolhiam-se a comer frugalmente três ou quatro vezes por ano, justamente em dias de preceito católico; muitos avaros davam esmolas, à noite, ou nas ruas mal povoadas; vários dilapidadores do erário restituíam-lhe pequenas quantias; os fraudulentos falavam, uma ou outra vez, com o coração nas mãos, mas com o mesmo rosto dissimulado, para fazer crer que estavam embaçando os outros.

A descoberta assombrou o Diabo. Meteu-se a conhecer mais diretamente o mal, e viu que lavrava muito. Alguns casos eram até incompreensíveis, como o de um droguista do Levante, que envenenara longamente uma geração inteira, e, com o produto das drogas, socorria os filhos das vítimas. No Cairo achou um perfeito ladrão de camelos, que tapava a cara para ir às mesquitas. O Diabo deu com ele à entrada de uma, lançou-lhe em rosto o procedimento; ele negou, dizendo que ia ali roubar o camelo de um drogomano; roubou-o, com efeito, à vista do Diabo e foi dá-lo de presente a um muezim, que rezou por ele a Alá. O manuscrito beneditino cita muitas outras descobertas extraordinárias, entre elas esta, que desorientou completamente o Diabo. Um dos seus melhores apóstolos era um calabrês, varão de cinqüenta anos, insigne falsificador de documentos, que possuía uma bela casa na campanha romana, telas, estátuas, biblioteca, etc. Era a fraude em pessoa; chegava a meter-se na cama para não confessar que estava são. Pois esse homem, não só não furtava ao jogo, como ainda dava gratificações aos criados. Tendo angariado a amizade de um cônego, ia todas as semanas confessar-se com ele, numa capela solitária; e, conquanto não lhe desvendasse nenhuma das suas ações secretas, benzia-se duas vezes, ao ajoelhar-se, e ao levantar-se. O Diabo mal pôde crer tamanha aleivosia. Mas não havia que duvidar; o caso era verdadeiro.

Não se deteve um instante. O pasmo não lhe deu tempo de refletir, comparar e concluir do espetáculo presente alguma coisa análoga ao passado. Voou de novo ao céu, trêmulo de raiva, ansioso de conhecer a causa secreta de tão singular fenômeno. Deus ouviu-o com infinita complacência; não o interrompeu, não o repreendeu, não triunfou, sequer, daquela agonia satânica. Pôs os olhos nele, e disse-lhe:

— Que queres tu, meu pobre Diabo? As capas de algodão têm agora franjas de seda, como as de veludo tiveram franjas de algodão. Que queres tu? É a eterna contradição humana.


(ASSIS, Machado de. Volume de contos. Rio de Janeiro: Garnier, 1884.)
Fonte: http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/bv000195.pdf


Nota do EdV:

Os grifos são do blog, claro.

Dizem que, apesar do fracasso, o diabo não desistiu de levar sua idéia adiante, e que só teria mudado um pouco a estratégia.

Alguma coisa relacionada ao nome de sua instituição e a revelar sua própria identidade, se não me engano.

E que estaria tendo muito mais sucesso agora.

Dizem...!

Não sei bem.